Aplicações e benefícios da análise por elementos finitos

Postado em: 01 / 07 / 2012

Figura 1 - MEF permite calcular e simular o comportamento do produto ou estrutura na fase de projeto

Avelino Alves Filho

As exigências no processo de desenvolvimento de produtos são cada vez mais intensas. Cumprir prazos com os menores custos possíveis é hoje questão de sobrevivência. Por isso, uma das soluções para atender a essas exigências está no MEF (Método dos Elementos Finitos) que permite às empresas calcular, simular e analisar o produto detectando e corrigindo possíveis falhas ainda na fase de projeto.

É crescente o número de empresas que utilizam o MEF na solução de problemas estruturais e em outras aplicações mecânicas para obter produtos com alta qualidade e desempenho. O MEF permite trabalhar com a engenharia preditiva, simulando no computador o comportamento dos componentes, antecipando assim a detecção de falhas e a correção dos problemas.

A ideia central do MEF é a construção de modelos (protótipos digitais) usados para simular a condição real de uso do produto. Os testes de campo e laboratório são realizados no protótipo digital e a consequência imediata é a redução de prazos e custos envolvidos em ferramental, protótipos físicos e validação, por intermédio da eliminação do processo de tentativa e erro.

Vamos discutir neste artigo os conceitos que estão por trás dessa poderosa ferramenta de análise que é o MEF. É evidente que o aprofundamento dessas ideias deverá ser efetuado por intermédio de literatura específica, indicada no final deste texto.

 

Conheça os dois conceitos centrais do MEF 

1– A identificação dos elementos que constituem um conjunto

Em muitas situações práticas, a identificação dos componentes de um sistema, ou mais particularmente de uma estrutura, parece uma tarefa quase que óbvia. Por exemplo, para uma estrutura espacial metálica, constituída unicamente por vigas, é natural identificar os componentes individuais de vigas ou elementos, que conectados entre si nas juntas ou nós formarão o conjunto estrutural, como mostra a Figura 2. O conjunto é formado a partir de uma montagem de elementos individuais. O MEF baseia-se na ideia de que a partir do entendimento do comportamento de cada elemento, poder-se-á entender o funcionamento do conjunto. Ao entender as partes compreende-se o todo. Essa ideia é vital no MEF.

 

Figura 2 – O conjunto estrutural e os elementos que o compõe uma estrutura metálica espacial

2 – O conceito de rigidez – A chave para prever o comportamento de uma estrutura

Todos nós temos a ideia de rigidez desde as primeiras aplicações com os elementos elásticos (ou molas) da física básica. Uma mola quando comprimida ou tracionada deforma-se. Como avaliar essa deformação? Basta conhecermos a sua constante elástica k. A constante elástica de uma mola representa matematicamente a sua rigidez. Existe uma relação simples entre a força aplicada na mola (F), a sua deformação (x) e a rigidez. É a famosa lei de Hooke, ou F = k.x.

Conhecendo a força e a rigidez, determinamos a deformação. Por exemplo, se uma mola tem constante k = 100 Kgf/mm (100 Kgf por mm), significa que para 100 Kgf de força aplicada a mola deforma 1 mm, e assim proporcionalmente (no âmbito linear). Então, o conhecimento da rigidez de um elemento é o passaporte para o cálculo de sua deformação. Note que esse conceito será muito importante, pois os engenheiros que trabalham com estruturas vivem preocupados em calcular deformações de estruturas e seus componentes, e para isso deverão conhecer a rigidez do conjunto e seus elementos.

Todos nós trazemos também da física básica, a ideia de um conjunto de molas trabalhando juntas (Molas em série, em paralelo…). Ao aplicarmos uma força no conjunto, este se deforma. Como avaliar essa deformação? Aí entra o conceito de mola equivalente ou rigidez equivalente. É possível determinar a deformação do conjunto, considerando-o como uma mola só, que tem uma rigidez equivalente ao conjunto como um todo. Para determinar a rigidez equivalente basta conhecer a rigidez de cada componente individual do conjunto.

Vamos aplicar essa ideia à estrutura da Figura 2. O objetivo do engenheiro é determinar a deformação do conjunto de molas e avaliar se essa deformação é aceitável dentro dos critérios de engenharia. Para isso ele precisa conhecer a rigidez do conjunto (da estrutura inteira). Aí entra o software de MEF, um poderoso aliado do engenheiro de cálculo. Com a ajuda do software é possível avaliar a rigidez da estrutura a partir da rigidez de cada elemento. Conhecendo as forças que solicitam a estrutura, é possível calcular a sua deformação.

A diferença entre o exemplo das molas e de uma estrutura real, é que na mola está presente apenas o conceito de rigidez axial, pois a mesma transfere apenas forças axiais. Em uma viga, por exemplo, estão presentes diversos componentes de rigidez simultaneamente como rigidez axial, rigidez à flexão, rigidez à torção e ao cisalhamento e, consequentemente, as correspondentes deformações.

 

Aplicações gerais

Figura 3 - Modelo 3D do chassi de caminhão gerado em um software CAD para ser submetido à análise

A Figura 3 representa o modelo de um chassi gerado em um software de CAD. Nesse caso o objetivo do engenheiro de cálculo é determinar a  deformação do chassi. Para cumprir essa tarefa ele precisará conhecer a rigidez do conjunto (chassi) e as cargas que atuam nele. A rigidez desse conjunto é determinada a partir da rigidez de cada um dos seus elementos. A diferença entre esse exemplo e o exemplo da estrutura de vigas, é que na estrutura de vigas a subdivisão é óbvia: os elementos de viga são conectados naturalmente entre si em suas extremidades, fomando os nós.

No caso do chassi, essa subdivisão deve ser proposta pelo engenheiro com base no conhecimento dos conceitos que ele tem do MEF. Ele cria uma malha de elementos finitos como mostra a Figura 4, de forma que a partir do conhecimento da rigidez de cada elemento do modelo (os pequenos elementos quadrilaterais), o software contabiliza a rigidez do conjunto. Assim, com o auxilio do computador, que resolve milhares de equações, a deformação do conjunto, o nível de esforços internos em cada trecho da estrutura e as tensões são calculados (Figura 4).

 

Figura 4– Malha de elementos finitos do chassi de caminhão gerada em um software de MEF

O engenheiro então tem as informações para tomar decisões sobre o comportamento do produto. A escolha do tamanho adequado da malha não nos parece óbvia em uma estrutura contínua como o chassi. E realmente não é. Depende do conhecimento das propriedades do elemento escolhido para representação do problema, que é a mais fundamental característica do MEF. Certamente ninguém viu no mundo real um chassi quadriculado como o da Figura 4 andando na rua. Essa subdivisão é artificial.

 

Figura 5 – Tensões atuantes em elementos do chassi de caminhão geradas a partir de simulações

Trabalhando com software de MEF

Dois aspectos iniciais chamam a atenção e constituem as características principais do MEF:

• A subdivisão da estrutura em elementos, isto é, a malha de elementos finitos;

• A escolha do elemento apropriado para modelar uma dada situação física.

Os softwares de MEF oferecem uma biblioteca de elementos, cada qual tentando representar um comportamento físico diferente conhecido da mecânica estrutural (placas, cascas, membranas, sólidos, vigas, molas etc.). Esse comportamento é descrito por intermédio de funções matemáticas que em última análise contabilizam a rigidez daquele elemento individual. Dispondo da biblioteca de elementos, podemos avaliar a rigidez da estrutura inteira a partir da rigidez de cada elemento. Este constitui o trabalho de elaboração do modelo em elementos finitos.

Tendo montado o modelo estrutural, podemos determinar a configuração deformada da estrutura no computador, por intermédio dos deslocamentos dos nós, qualquer que seja a forma da estrutura e o tipo de carregamento. Estamos então em condições de determinar o estado de tensões na estrutura e fazer a avaliação de sua resistência mecânica, como é representado na Figura 5 para o caso do chassi.

Assim, o MEF é uma ferramenta extremamente valiosa para ajudar as equipes de engenharia em uma das tarefas mais importantes no desenvolvimento de produtos: descobrir, por intermédio de um panorama de tensões no componente, o comportamento estrutural do produto para garantir que não haverá falha tanto em condições normais de operação quanto em situações críticas de operação.

Para executar uma análise estrutural que conduza a decisões adequadas, devem ser observados alguns pré-requisitos:

• Entendimento claro do problema físico a ser simulado;

• Conhecimento do comportamento estrutural desejado (critério de projeto);

• Propriedades dos materiais envolvidos;

• Características dos elementos finitos envolvidos na análise;

• Definição da região objeto de interesse, definindo a extensão do modelo de análise;

• Condições de contorno – Cargas e vínculos da estrutura.

 

Figura 6 - Exemplos de simulações realizadas em diversos componentes utilizando softwares de MEF

O modelo proposto deve representar trecho a trecho da forma mais acurada possível o que ocorre na estrutura real. Essa representação só poderá ser feita se o analista estrutural conhecer o comportamento dos elementos finitos disponíveis e identificar na estrutura objeto da análise esse comportamento para poder utilizar o elemento adequado em cada aplicação. Essa tarefa não tem mistério, mas tem um procedimento adequado de fazê-la.

Em resumo, os programas para cálculo de elementos finitos não são ferramentas mágicas, que independem do julgamento do analista, pois constituem um auxílio a ele, que deve conhecer os conceitos fundamentais do MEF e o comportamento dos principais elementos da biblioteca do programa. Uma base conceitual adequada é o melhor caminho para obter bons resultados nas aplicações práticas do dia a dia com os softwares de MEF.

Outro aspecto que vale citar é o caráter aproximado do MEF. Por exemplo, quando montamos um modelo com 10000 nós, o software só calcula os deslocamentos desses 10000 pontos, mas julgamos que eles são suficientes para representar a deformação do conjunto adequadamente. Por isso, dizemos que o modelo é discretizado, não considera os infinitos pontos da estrutura que é contínua. A experiência prática de uso do MEF mostra que escolhendo adequadamente os elementos com critério, os resultados são extremante confiáveis.

A ideia do MEF foi inicialmente introduzida para uma aplicação de cálculo estrutural porque as aplicações iniciais do MEF foram desenvolvidas historicamente para essa área da engenharia. Podemos citar algumas aplicações hoje normalmente disponíveis nos softwares de análise pelo MEF: análise linear de estruturas; vibrações livres e forçadas; análise não linear envolvendo grandes deflexões e grandes deformações, plasticidade, fluência, instabilidade estrutural etc.

Entretanto, as técnicas de discretização são mais gerais e podem ser aplicadas em outras áreas da engenharia e análise. Atualmente essas técnicas são poderosas ferramentas em física matemática tais como: transferência de calor; escoamento de fluidos; ondas eletromagnéticas; hidrodinâmica etc. As grandezas envolvidas nesses casos são as temperaturas, velocidades etc., são as grandezas associadas aos fenômenos físicos objeto da análise.

Porém, a questão central do MEF continua a mesma. Qualquer que seja a natureza do problema físico que pretendemos modelar não estaremos calculando a resposta nos infinitos pontos do contínuo em primeira instância, mas apenas em alguns, os nós do modelo eleitos pelo processo de discretização.

 

Avelino Alves Filho, engenheiro e Prof. Dr., é diretor técnico do NCE – Núcleo de Cálculos Especiais, empresa que atua na área de serviços e implantação de tecnologia CAE. Avelino trabalha com MEF há 32 anos e é autor dos livros “Elementos Finitos – A Base da Tecnologia CAE” e “Elementos Finitos – A Base da Tecnologia CAE/Análise Dinâmica”, pela Editora Érica.

www.nce.com.br

 

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